sexta-feira, 16 de julho de 2010

A ADOLESCÊNCIA


Dentro do processo de desenvolvimento do ser humano, a adolescência é uma das etapas mais significativas em termos de transformações. É durante este período que o indivíduo evolui do seu estágio infantil e dependente para o de adulto e independente. Neste processo, os aspectos biológicos, psicológicos, culturais e sociais, assumem especial relevância.
É neste processo complexo, que o indivíduo vê o corpo transformar-se, enfrenta angústias inerentes à estruturação da sua personalidade, redefine valores e conceitos, busca novos relacionamentos e autonomia.
Nesta etapa, os adolescentes apresentam em regra algumas características que podem preocupar os adultos; procuram estar mais tempo com os amigos do que com a família, não se preocupam com a gestão do tempo ou com horários, são contestadores e irreverentes. Manifestam condutas contraditórias, apresentam com frequência mudanças de humor e consideram-se invulneráveis aos perigos, envolvendo-se em situações de experimentação de limites nem sempre controladas.
Neste turbilhão de modificações é natural que ocorram conflitos. Conhecer este processo e as características próprias da adolescência, permitirá aos pais e educadores uma participação adequada e activa de molde a prevenir a eclosão de eventuais problemáticas.

Qual a faixa etária abrangida pela adolescência e quais as etapas deste período? Quando se inicia a adolescência? Existe alguma controvérsia relativamente ao período etário abrangido pela adolescência? Quando se inicia? Qual a sua duração? É possível limitá-la a períodos etários ou depende de outras variáveis, como a maturidade física e emocional, independência social e económica? Tais limites imprecisos levaram inclusive ao surgimento de uma faixa “nebulosa”, denominada de pré-adolescência.

A Organização Mundial da Saúde, (OMS) considera como adolescente o indivíduo entre 10 e 20 anos incompletos.

Já o Estatuto da Criança e do Adolescente aponta outra faixa etária: dos 12 aos 18 anos.

Os aspectos biológicos e psicossociais da adolescência não estão necessariamente interligados. É possível que as alterações corporais (puberdade) tenham o seu início sem que outras características da adolescência se manifestem.

O início da puberdade pode ser determinada por manifestações físicas no organismo, desencadeadas por processos hormonais. A menina que começa a apresentar um aumento dos seios (entre os 9 e 13 anos) e o menino um aumento do volume dos testículos (entre os 10 e 14 anos), vêem iniciado o seu processo pubertário, processo este que estará concluído por volta dos 18 anos.
Já em relação aos aspectos psicossociais, é mais difícil determinar idades específicas, já que estão envolvidos vários processos, entre eles a definição da imagem corporal, alterações na relação com os pais, estabelecimento de valores e noções próprias de ética, aquisição de novas funções e papéis sexuais, etc.
Faz mais sentido pensarmos a adolescência como o período que se situa, biologicamente, psicologicamente e culturalmente falando, entre a infância e a vida adulta, sem especificar uma faixa de idade definida. Trata-se de um período de transição durante o qual a criança modifica-se, física, mental e emocionalmente, tornando-se um adulto. Ocorrem novas experiências, havendo um constante desequilíbrio, pois os velhos padrões parecem desadequados e os novos ainda não estão bem assimilados. Por volta dos 16-18 anos o adolescente começa a estabelecer a sua identidade, novos padrões de relacionamento social, novas metas e papéis.
O indivíduo torna-se adulto quando estabelece uma identidade sexual, mantém relações afectivas estáveis, pode assumir compromissos profissionais, adquire independência económica e tem os seus próprios valores morais e éticos. A idade em que isto vai ocorrer dependerá da personalidade do indivíduo, das suas aprendizagens e do modo como absorveu e integrou as diversas experiências de vida.

As três etapas da adolescência:

Adolescência precoce ou inicial (dos 10 aos 14 anos) o jovem busca adaptar-se às modificações que ocorrem no corpo e inicia o seu processo de independência e separação dos pais. As características infantis, embora ainda presentes, começam a ser substituídas por outras mais maduras.

Adolescência média (dos 15 aos 17 anos) a maioria dos jovens nesta faixa etária já completou as suas modificações biológicas mais importantes e as transformações da puberdade já não são tão significativas. Agora, o importante é consolidar a imagem corporal, buscar uma identidade própria e desenvolver a sexualidade. A conduta costuma ser estereotipada, isto é, há identificação plena com o grupo de pares. É frequente ocorrerem situações em que se testam limites e a independência.

Adolescência tardia (dos 17 aos 20 anos) emergem os valores e comportamentos adultos e predomina uma identidade mais estável. O relacionamento com o companheiro do sexo oposto toma-se mais estreito, intimo e afectuoso. Nesta etapa, os adolescentes buscam viabilidade económica e estabilidade social, desenvolvem um elaborado sistema de valores e verbalizam de acordo com as suas próprias ideias. É frequente observar-se uma significativa melhoria no relacionamento com os pais e familiares.

Características do adolescente

Alimentação

O rápido crescimento físico do adolescente geralmente leva a um aumento do apetite. Nesta fase muitos pais ficam surpreendidos com o verdadeiro "saco sem fundo" em que os filhos se transformam. Isto reflecte a grande necessidade de resposta do organismo face ao rápido processo de aumento da massa corporal. Infelizmente, esta fome muitas vezes não é saciada pelos alimentos mais adequados. O adolescente prefere alimentos não convencionais e de rápida preparação, o que faz o grande sucesso dos "fast-food". São refeições com alto valor calórico mas bastante deficientes em nutrientes necessários ao organismo.
Em relação à alimentação, há dois grandes riscos nesta faixa etária que requerem a atenção dos pais: a obesidade pelo excesso de calorias e, ao contrário, o emagrecimento. Este último pode ser desencadeado pela busca do corpo ideal ou por um problema psicológico mais sério, denominado "anorexia nervosa", que deve merecer acompanhamento técnico competente.

Relacionamento com os pais

A relação entre pais e filhos altera-se com o desenvolvimento destes. Neste processo, a adolescência é um período de transição entre a dependência que caracteriza a relação "pais - filhos crianças" e o relacionamento de afecto, igualdade e respeito mútuo entre "pais - filhos adultos".
Justamente por ser um período de transição, não é fácil para pais e filhos relacionarem-se; como tal, esta
passagem de criança para adulto inclui muitas perdas e ganhos recíprocos. O jovem, embora vibre com as suas novas conquistas de independência, sente algum pesar pela perda do relacionamento infantil que mantinha com os seus pais. Estes, por sua vez, ao mesmo tempo que superam as responsabilidades inerentes à dependência da criança, necessitam proceder à elaboração da perda de seu filho infantil e da sua própria juventude.
O processo de conquista da independência acarreta frequentemente perturbação e ambiguidade, até os pais e o adolescente aprenderem a desempenhar os novos papéis.
Grande parte do comportamento que se observa no adolescente relaciona-se com a luta que tem de travar pela sua independência contra as restrições e o controlo externo que se opõem ao seu processo de maturação. No início deste processo o adolescente revela-se crítico e geralmente distancia-se de ambos os pais, mantendo-se afastado do lar e das actividades familiares, passando cada vez mais tempo com os amigos.
Se os pais tentarem compreender este processo terão sem dúvida menores dificuldades no relacionamento com os seus filhos adolescentes.

A importância do grupo de pares

No período da adolescência os amigos, assumem um papel fundamental. São os amigos da mesma idade e com as mesmas características que possibilitam ao jovem enfrentar as modificações que se vão operando no corpo e no seu modo peculiar de ver e sentir a realidade. São os jovens que integram o grupo de pares que entendem melhor as suas ideias, pois comungam dos mesmos interesses, das mesmas aspirações e estão dispostos a enfrentar os mesmos desafios.
Embora seja natural a preocupação dos pais com a intensa vinculação dos filhos aos amigos, isto não significa necessariamente que possam surgir situações de risco ou comportamentos agressivos e anti-sociais.
É claro que as actividades em grupo podem ser mais liberais e ousadas, mas dependerá sempre do indivíduo que nelas participa saber até onde dever poder ir. Nesta fase, como ocorreu nos primeiros anos de vida, a busca de limites é necessária, assim como é imprescindível que os pais estabeleçam de forma clara quais são esses limites.
Embora o jovem possa vir a tornar-se muito dependente dos valores, conceitos e julgamentos de seus amigos, o que leva a uniformidade de comportamentos, vestuários, vocabulário e gíria, isto não significa necessariamente riscos para o adolescente. O vínculo com o grupo muitas vezes será positivo e irá proporcionar a solidariedade, espírito de equipa e a formação de lideranças positivas.

Humor e contradições

É uma das mais peculiares características do adolescente a mudança frequente de humor e de sentimentos. Os momentos de angústia, desespero e de situação irremediável podem ser substituídos subitamente por demonstrações de alegria e despreocupação, deixando os pais em desespero.
Qualquer facto, aparentemente sem importância, pode desencadear crises enormes e sem perspectivas de solução, mesmo com todos os argumentos em contrário por parte dos pais. As perdas geralmente são consideradas irrecuperáveis e insubstituíveis num primeiro momento, para logo a seguir serem totalmente esquecidas.
Estas mudanças de humor e de valorização em relação a determinados acontecimentos são normais nesta fase e fazem parte do processo de aprendizagem do adolescente em elaborar perdas e a conviver com uma grande variação de situações de seu dia a dia.

Mudar o mundo

Muitas das transformações ocorridas durante a evolução da sociedade humana foram desencadeadas por
movimentos de jovens que demonstraram disposição para mudar conceitos e posturas. A inconformidade com situações, a facilidade para enfrentar desafios e contestar valores, a tendência à união em grupos de iguais, são alguns dos factores que proporcionam ao jovens disposição para estas atitudes combativas e a provocar transformações. Estas atitudes são importantes na formação do indivíduo, na consolidação de conceitos e na inserção do jovem na sociedade como um membro activo e participante.

Noção de tempo

Os adolescentes costumam deixar os pais desesperados quanto à noção de tempo. Para os jovens, um compromisso imediato muitas vezes não é considerado como tal, e eles esperam até o último instante para tomar as providências. Isto ocorre com frequência em relação aos estudos. Por outro lado, também é frequente anteciparem a ansiedade e exigirem dos pais providências para algo que ainda está longe de ocorrer.
A forma de lidar com o tempo reflecte nos adolescentes a dificuldade de conviver com muitas ansiedades e frustrações. O imediatismo é típico neste período, sendo difícil nesta idade os tratamentos prolongados e que não demonstrem resultados imediatos, como por exemplo as dietas para a perda de peso, acne e alergias.

O pensamento do adolescente

O adolescente modifica gradualmente a sua forma de pensar e uma das grandes conquistas deste período é a aquisição da capacidade de abstracção, ou seja, a de raciocinar abordando várias hipóteses, não se limitando a dados concretos. Nesta fase é possível imaginar experiências nunca vivenciadas e com isto estruturar e imaginar novas posturas éticas, sociais e filosóficas. É capaz de imaginar consequências futuras de acções que deve realizar agora, possibilitando uma espécie de planificação.
Surge de forma mais clara a lógica dedutiva: "se – então". Estas novas características permitem ao jovem sonhar e fantasiar, possibilitando momentos de fuga da realidade e a idealização de situações ideais e agradáveis.
O adolescente é também um pouco egocêntrico, já que, em regra, considera suas ideias e sentimentos como únicos e muito importantes ou significativos para os que o rodeiam.

Em busca de uma identidade

Identidade é o reconhecimento por parte do indivíduo de que é um ser único, distinto de todos os demais, com características exclusivas. A consolidação desta identidade é um processo longo e exige elaborados processos.
É na adolescência que o indivíduo busca consolidar esta identificação, sendo ela uma das tarefas cruciais desta fase da vida. É preciso determinar definições como "quem sou eu?", "quais são as minhas responsabilidades perante as pessoas e a sociedade?’, "qual o meu papel sexual"? entre tantas outras.
Não é de estranhar, portanto, que este processo seja caracterizado por progressos e retrocessos e pelo surgimento de identidades não duradouras que surgem conforme o momento e a situação vivida.
Nesta busca de identidade é frequente o jovem apresentar várias transformações, mostrando-se diferente em relação aos pais e principalmente face a pessoas do seu convívio. Isto pode levar a descrições totalmente diferentes sobre um mesmo jovem feitas por pais, professores, amigos e pais de amigos.
O vestuário do adolescente costuma ser diferente e isto também reflecte a busca em diferenciar-se, embora procurando identificar-se com o seu grupo de iguais, não só no vestuário mas também na linguagem, utilizando muitas vezes vocabulário específico, concorrendo esta uniformidade para a sua segurança e reforço da auto estima.
O jovem busca modelos para tentar moldar as suas próprias características. Neste sentido, assumem grande importância o papel dos ídolos, que vão modificando-se conforme a evolução do processo de adolescência.
Neste aspecto, cabe à sociedade (principalmente aos responsáveis pelos média), uma adequada escolha destes ídolos a serem oferecidos à juventude.

Testar novos limites

Quando analisamos a idade "adolescente", lembramo-nos muitas vezes da criança entre um e três anos de idade. Algumas características são muitos semelhantes, entre elas a busca intensa de limites.
Quando o jovem reconhece que a partir de um determinado momento pode fazer certas coisas que antes não lhe eram permitidas, como ficar mais tempo fora de casa, sair à noite, tomar algumas decisões, um amplo universo de oportunidades se abrem.
Mas a grande questão que surge é: "até onde eu posso ir?” Buscar estes limites é uma tarefa difícil, quer para uma criança de dois anos, quer para um adolescente de catorze. A resposta só pode ser obtida pela tentativa, pelas reacções dos pais e pelas repercussões das atitudes tomadas. Ou seja, pela velha técnica da "tentativa e erro".
Se é difícil para o adolescente identificar quais são os limites, não é menos fácil para os pais estabelecê-los. Mas se algo é definitivo, esse algo é: limites são imprescindíveis, assim como imprescindível é ter bom senso em estabelecê-los.

Imagem corporal

A imagem corporal é a ideia que o indivíduo tem do seu próprio corpo. Pode-se imaginar a dificuldade que o adolescente tem em assimilar a sua imagem corporal, pois neste período da vida ocorrem grandes modificações.
O surgimento de pelos, a mudança de voz, o aumento dos seios, o acne, entre tantas outras modificações, geram com frequência sentimentos de insegurança e ansiedade. Lidar com estas transformações não é uma tarefa fácil e por isto é necessário entender as manifestações típicas desta idade, que incluem o uso de roupas e adereços "diferentes".

Conflito de gerações

A adolescência é, em regra, um período conturbado, difícil, de conflitos frequentes entre pais e filhos. Realmente, os adolescentes apresentam características que deixam os adultos preocupados. Procuram estar mais com os amigos do que com a família. Não se preocupam com o tempo ou com horários. São contestadores e reivindicativos. Manifestam condutas contraditórias. Apresentam mudanças de humor e de ânimo com frequência. Consideram-se invulneráveis aos perigos.
Mas estas são características quase universais repetindo-se com o passar das gerações, alterando-se apenas de acordo com os novos costumes da sociedade em que vivem. E não são atitudes ou condutas injustificáveis.
Afinal, um indivíduo deixa para trás um corpo de criança, uma identidade e um papel infantis e começa a fazer parte do mundo adulto, sendo natural que algumas dificuldades manifestem-se neste período de adaptação. As dificuldades que os pais sentem com os filhos nesta época são maiores do que noutras devido à complexidade das mudanças biopsicossociais que vêm ocorrendo.
A intensidade dos conflitos irá depender de vários factores, entre eles as características individuais de pais e filhos. Mas um dos aspectos mais importantes a considerar é a relação que estabelecem entre eles, relação que se iniciou na verdade quando o filho nasceu.
Uma criança que desde pequena aprendeu os limites, a aceitar a os direitos dos outros, a reconhecer os seus deveres, a dividir e a respeitar os membros da família, com certeza que terá mais facilidade para vivenciar a sua adolescência sem maiores conflitos. Se desde cedo a relação primou pela ausência de limites, de autoridade e de respeito, estas características irão manifestar-se provavelmente na adolescência.
É importante que os pais conheçam o processo normal do desenvolvimento dos adolescentes e as suas características. Este conhecimento permitirá reconhecer os comportamentos ajustados e os seus desvios, manter a autoridade e estabelecer limites sem criar grandes conflitos.
A instabilidade, a contradição, o desafio e os transtornos podem ser inevitáveis, mas são transitórios; caberá aos pais não abdicarem da sua condição de adultos e do seu papel de pais educadores.

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