sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

CONFRONTAÇÃO - 1

(CONTINUAÇÃO)
A principal pergunta em relação ao ciúme, é sem dúvida aquela até que ponto o mesmo está na fronteira da normalidade de um relacionamento ou se tornou algo obsessivo? A resposta é extremamente simples, depende da quantidade de raiva ou ódio que alguém acumula todas as vezes que sente ciúmes por determinada pessoa. Essa raiva é um mecanismo defensivo que visa depreciar a relação, antecipando uma provável perda, no intuito de se esquecer o mais rapidamente possível do antigo objecto de amor, apontando seus defeitos ou imperfeições. Nesse sentido podemos falar da convergência do amor e ódio num mesmo relacionamento, sendo que no ciúme o predomínio do segundo é extremamente significativo. O ciúme tem a característica de atrair todos os pólos dos mais negativos sentimentos humanos, como, por exemplo, inveja, comparação, posse, rejeição, temor, ansiedade e principalmente a terrível sensação de abandono. Obviamente numa sociedade marcada pela competição e avareza no plano económico, não poderia ser diferente na esfera pessoal. A maior ingenuidade de todas é acreditar que seremos pessoalmente diferentes daquilo que somos no âmbito profissional e social.
O ciúme revela a face mais marcante da disputa de poder numa sociedade, assim como todo o sentimento de superioridade ou inferioridade resultante desse processo. É a personificação daquilo que diariamente todos falam sobre o combate na esfera amorosa, ou seja, quem será o dominador e dominado num determinado relacionamento, ou em última instância, qual dos dois arcará com a maior parcela de dor resultante de uma relação. O que mais detestamos no ciúme é que o mesmo denuncia o nosso grau de evolução e preparo emocional, a nossa segurança interior, a paciência e o genuíno sentimento de espontaneidade e doação. Quando tudo isso falha, estamos diante dos nossos mais profundos sentimentos de mesquinharia e interesse pessoal, pois a revelação de nossa ambição passa a ser um grande incómodo, e quando descobrimos que o nosso parceiro, poderá arriscar nova fronteira, caso não esteja satisfeito com o relacionamento, é o começo da extrema tortura mental e paranóica. Somos então feridos mortalmente em nosso narcisismo e ideia ilusória de conquista. O ciúme como eu já escrevi, é a prova final de que a competição trespassou os limites do campo social, afectando um dos últimos pilares de nossa segurança, a certeza de termos por completo determinada pessoa. Uma das características mais nefastas do ciúme é o sentido de ampliação do mesmo. Quero dizer com isto que primeiramente o ciúme se restringe à esfera afectiva ou um possível temor à traição, para em seguida se alastrar a outras áreas da personalidade humana. A pessoa que sente demasiado ciúme começa por também se incomodar com outras partes do desenvolvimento do seu parceiro, principalmente no tocante as potencialidades e criatividade do mesmo. Começa a desejar secretamente a derrocada profissional do parceiro, com o intuito de que este se torne cada vez mais dependente. Este é apenas um exemplo. Neste ponto o ciúme se une rigorosamente a outra emoção humana extremamente complicada, a inveja, e a relação se torna uma tortura infindável, onde o único caminho para a sobrevivência daquele que sente ciúme é a aniquilação das capacidades do seu companheiro. Esta inveja descrita ou em comparação extrema é quase sempre o alerta fatídico do esgotamento absoluto do relacionamento. A minha teoria pessoal e muito intima, diz que o ciúme é um tipo de projecção, ou seja, a pessoa acusa o outro de desejar o que ela própria gostaria, porém sempre negando tal facto, seja por culpa, vergonha ou orgulho. É impressionante, entretanto, como o ciúme vai aumentando quanto mais a pessoa nega o descrito anteriormente, pois se serve cada vez mais de sistemas defensivos para que o seu companheiro não perceba que é ele que está sedento para buscar outra relação, e assim sendo é mais fácil para este último sentir primeiro o ciúme a fim de atestar sua completa inocência. É muito comum que alguém espere do outro uma reacção de ciúmes de vez em quando, com o intuito de testar se ainda existe o desejo ou algo mais. O problema é quando se acha que o oposto do ciúme é a total insensibilidade ou apatia, pois neste ponto perde-se toda a noção de equilíbrio numa relação, actuando-se apenas no limite extremo; excessivo ciúme ou negligência, e aí obviamente todos preferem o primeiro, esquecendo-se dos seus efeitos nefastos. A questão do ciúme remete ao medo da perda e em última instância ao medo da morte. Esses sentimentos sempre estão mais presentes em pessoas marcadas por experiências de abandono ou desamparo, sendo que qualquer relação dispara esse conteúdo descrito. Como disse anteriormente o medo é o soberano, impedindo o livre fluir de outras emoções ou vivências. Ao invés do ciúme, deveríamos buscar provas de amor em áreas como: dedicação, apoio humano, constante diálogo e desejo de renovação, companheirismo e finalmente eterna presença. Se realmente queremos que uma relação tenha êxito, temos de estar atentos não apenas aos perigos da mesma, mas principalmente quando tomamos emprestados poderosos sentimentos humanos destrutivos, que ao contrário de aprofundarem, corroem por completo algo que poderia ter um desfecho de harmonia e prazer.

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