terça-feira, 8 de setembro de 2009

VIOLÊNCIA CONTRA AS CRIANÇAS

Em casa e na família
As crianças são habitualmente mais felizes e mais protegidas quando estão na sua casa e com a sua família. A Convenção sobre os Direitos da Criança reconhece que a família é o ambiente natural para o crescimento e bem-estar da criança. Mas, infelizmente, para algumas crianças, a casa é um local violento e muita desta violência é escondida, porque se passa dentro de portas ou por medo ou vergonha.
Muitas crianças sofrem de violência - não apenas violência física mas também insultos e humilhações - como uma forma de disciplina rígida. Até agora, apenas 16 países proíbem os castigos corporais em casa.

O que fazer?
1- Lutar para alterar atitudes que consideram normal a violência contra as crianças, nomeadamente a aceitação dos castigos corporais ou práticas tradicionais nefastas;
2- Criar ou reforçar de programas para apoiar os pais e as pessoas que cuidam das crianças no desempenho do seu papel fundamental, incluindo programas de educação parental que tenham em conta questões de género e que promovam formas não violentas de disciplina;
3- Incluir, nos investimentos em serviços de carácter social, programas de qualidade para a primeira infância, visitas domiciliárias, serviços pré e peri-natais, e programas geradores de rendimento para famílias carenciadas;
4- Criar programas dirigidos a famílias que vivem em circunstâncias particularmente difíceis, como por exemplo as que são chefiadas por mulheres e por crianças e também famílias de minorias étnicas.

Na escola e em ambientes educativos
Milhões de crianças passam mais tempo ao cuidado de adultos em ambientes educativos do que em qualquer outro lugar fora das suas casas. A Convenção sobre os Direitos da Criança exige que os Estados partes tomem todas as medidas adequadas para garantir que a disciplina escolar seja administrada em conformidade com a Convenção. Embora a escola tenha um papel importante na protecção das crianças contra a violência, para muitas delas a escola é um espaço de violência.
Quando praticada pelos professores e outros membros do pessoal auxiliar, ela inclui violência física, castigos psicologicamente humilhantes, violência sexual e com base no género de intimidação, chantagem, assédio. Os castigos corporais como bater numa criança com as mãos, paus, ou mangueiras são uma prática comum em escolas de muitos países. Embora os castigos corporais na escola tenham sido banidos em 102 países, há grandes diferenças na forma como a lei é aplicada.

O que fazer?
1- Promulgar leis que proíbam os castigos corporais na escola e em estabelecimentos de ensino e a criação de instrumentos para a sua aplicação prática. Criar mecanismos fiáveis, amplamente divulgados, confidenciais e acessíveis para que as crianças e as suas famílias possam reportar situações de violência;
2- Garantir a utilização de métodos de ensino e aprendizagem não-violentos. Adoptar medidas disciplinares que não se baseiem no medo, ameaças, humilhações ou força física;
3- Criar programas que tenham em conta todo o ambiente escolar, incluindo aspectos como a resolução de conflitos de modo não-violento e políticas de combate ao género de intimidação, chantagem, assédio.

Em Instituições de Acolhimento e de Justiça
Em todo o mundo, há cerca de 8 milhões de crianças que vivem em instituições, na maior parte dos casos devido a deficiências, problemas familiares ou à pobreza. Estas crianças correm sério risco de serem vítimas de violência praticada pelas pessoas responsáveis por elas e raramente têm acesso a mecanismos de queixa eficazes.
A violência praticada pelo pessoal – habitualmente sob pretexto de “disciplina” – inclui, por exemplo, bater nas crianças com as mãos, paus e mangueiras, bater com a cabeça das crianças contra a parede, metê-las dentro de sacos, amarrá-las aos móveis, fechá-las em compartimentos frigoríficos ou deixá-las ficar durante horas sobre os seus próprios excrementos.

O que fazer?
1- Dar prioridade a soluções que preservem os laços familiares. Quando as crianças precisam de cuidados fora de casa, procurar alternativas na família e na comunidade, a fim de garantir que a institucionalização seja utilizada de forma limitada e apenas quando for adequado para a criança em causa;
2- Descriminalizar delitos que só são crime quando cometidos por crianças, como vadiagem ou a fuga de casa, comportamentos de sobrevivência como mendigar, remexer no lixo ou deambular pelas ruas;
3- Criar mecanismos de queixa, investigação e aplicação da lei eficazes e garantir que as crianças em instituições, quer sejam de protecção ou de detenção, tenham conhecimento dos seus direitos;
4- Garantir um acompanhamento eficaz e o acesso regular de órgãos independentes a instituições de acolhimento e de justiça. Criar mecanismos de queixa acessíveis e confidenciais para as crianças e os seus representantes.

Na Comunidade
A Comunidade é o local onde as crianças vivem ou onde se encontram umas com as outras para praticar desporto, para o culto religioso ou para brincar; e são as ruas onde muitas crianças vivem ou trabalham; e é também o espaço virtual em que as crianças entram quando se ligam online através do seu computador ou do telemóvel. Em todos estes locais as crianças podem ser alvo de violência.

O que fazer?
1- Aplicar estratégias para reduzir os factores de risco imediato tais como o acesso fácil a drogas e álcool, posse e uso de armas e a utilização de crianças em actividades ilegais;
2- Reduzir as desigualdades sociais e económicas; incentivar e apoiar os governos locais e municipais para que proporcionem oportunidades recreativas e de lazer seguras e espaços públicos para as crianças;
3- Aplicar em pleno a legislação nacional contra o tráfico de seres humanos; garantir que as vítimas de tráfico não são criminalizadas;
4- Conceber e pôr em prática acções de formação sobre os direitos da criança para as forças polícias; introduzir nos cursos de formação das polícias matéria sobre as diferentes fases do desenvolvimento das crianças e o modo como lidar com crianças sob o efeito de drogas e do álcool;
5- Intensificar esforços na luta contra o uso das tecnologias de informação, incluindo a internet, os telemóveis e os jogos electrónicos, na exploração sexual de crianças e outras formas de violência.

As crianças de todo o mundo estão em perigo de sofrer violência em quase todos os ambientes das suas vidas: no lar, na escola, na rua, no trabalho, nas instituições e centros de detenção. Em muitos casos são golpeadas, torturadas, agredidas sexualmente ou, inclusive, assassinadas pelos mesmos indivíduos responsáveis por cuidarem delas. Em resposta a este escândalo global, a Assembleia Geral da ONU pediu ao Secretário Geral que realizasse um estudo em profundidade sobre a violência contra as crianças. Este pedido realizou-se depois de uma recomendação do Comité dos Direitos da Criança para que fosse realizado o referido estudo sobre a violência contra as crianças.
O estudo também se baseará na definição geral de abuso infantil acordada pelos especialistas que participaram da consulta sobre a prevenção do abuso infantil da Organização Mundial de Saúde: “o abuso ou maltrato infantil constitui toda a forma de maltrato físico e/ou psicológico, abuso sexual ou tratamento negligente ou comercial ou outra forma de exploração que cause ou possa causar dano à saúde da criança, à sua sobrevivência ou dignidade no contexto de uma relação de responsabilidade, confiança ou poder”.

Os ambientes
Os “ambientes” são as subdivisões ou áreas de estudo nos quais se pode produzir a violência contra a criança:
1. Violência no lar e na família
Inclui a violência física, psicológica e sexual.
2. Violência nas escolas e em ambientes educativos
Este inclui disciplina violenta e humilhante, assim como violência física, psicológica e sexual, abuso sexual e intimidação em escolas especiais (incluindo escolas militares) e também escolas tradicionais estabelecidas.
3. Violência em instituições
Inclui violência em situações de cuidado como orfanatos, casas de acolhida e outras, refúgios de ONG’s e instituições para crianças e jovens com deficiências.
4. Violência na comunidade e nas ruas
Inclui crianças em conflitos com a lei, violência de grupos organizados, assim como crianças e jovens envolvidos no crime organizado, porém, não em situações de guerra. Também são incluídos guardas de segurança privada, vigias, assim como práticas tradicionais prejudiciais.
5. Violência no âmbito do trabalho
Inclui crianças no trabalho doméstico, tráfico (para trabalhos forçados e exploração sexual), exploração sexual comercial (inclui turismo sexual) e trabalho infantil em situações de risco.

Os objectivos do estudo são:
Consciencializar o público sobre todas as formas de violência contra as crianças.
Um melhor entendimento das causas do problema e o seu impacto nas crianças, adultos e sociedades.
Examinar os mecanismos existentes para acabar com a violência contra crianças.
Identificar um plano internacional de acção para acabar com os abusos de uma maneira efectiva.

Este estudo sobre as consequências da violência nas crianças é da maior importância e oportunidade.
Embora inúmeros casos de violência continuem escondidos e por reportar, e por esse motivo, os números ficam muito aquém da dimensão do problema. As estatísticas incluídas no relatório revelam um panorama alarmante. Por exemplo:

1- A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que cerca de 53.000 crianças entre os 0-17 anos de idade foram vítimas de homicídio;
2- Segundo as últimas estimativas da Organização Mundial do Trabalho (OIT), 5.7 milhões de crianças realizavam trabalhos forçados ou em regime de servidão, 1.8 milhões estavam envolvidas na prostituição e pornografia, e 1.2 milhões foram vítimas de tráfico;
3- Em 16 países em desenvolvimento analisados no âmbito de um Inquérito Mundial sobre Saúde realizado nas escolas, a percentagem de crianças em idade escolar que afirmaram ter sido vítimas de intimidação verbal ou física na escola nos 30 dias anteriores à entrevista oscilava entre os 20% em alguns países e 65% noutros;
4- Segundo o Estudo, as crianças que se encontram em centros de detenção são frequentemente vítimas a actos de violência por parte do pessoal da instituição, por vezes como forma de controlo ou castigo, na maior parte dos casos por infracções menores. Em 77 países, os castigos corporais e outras formas de punição violentas são aceites como medidas disciplinares legais em instituições penais.

As marcas físicas, emocionais e psicológicas da violência podem ter sérias implicações no desenvolvimento da criança, na sua saúde e capacidade de aprendizagem. Alguns estudos mostraram que o facto de ter sofrido actos de violência na infância está relacionado com comportamentos de risco no futuro, tais como o consumo de tabaco, o abuso de álcool e drogas, inactividade física e obesidade. Por outro lado, estes comportamentos contribuem para algumas das principais causas de doença e de morte, nomeadamente para certos cancros, depressão, suicídio e problemas cardiovasculares.
O relatório apresentado à Assembleia Geral recomenda que seja tomado um amplo leque de medidas para prevenir e responder à violência contra as crianças em todos os locais e ambientes em que ocorre.
A nível global, o relatório recomenda a nomeação de um Representante Especial para a Violência contra as Crianças, com um mandato inicial de quatro anos, cuja missão consistirá em defender a causa ao mais alto nível, promovendo a prevenção e eliminação de todos tipos de violência contra as crianças e incentivando a cooperação e o seguimento neste domínio.

DIREITOS DA CRIANÇA
As crianças têm direitos
Em 20 de Novembro de 1989, as Nações Unidas adoptaram por unanimidadea
Convenção sobre os Direitos da Criança (CDC), documento que enuncia um amplo conjunto de direitos fundamentais – os direitos civis e políticos, e também os direitos económicos, sociais e culturais – de todas as crianças, bem como as respectivas disposições para que sejam aplicados.
A CDC não é apenas uma declaração de princípios gerais; quando ratificada, representa um vínculo jurídico para os Estados que a ela aderem, os quais devem adequar as normas de Direito interno às da Convenção, para a promoção e protecção eficaz dos direitos e Liberdades nela consagrados.

Este tratado internacional é um importante instrumento legal devido ao seu carácter universal e também pelo facto de ter sido rectificado pela quase totalidade dos Estados do mundo (192). Apenas dois países, os Estados Unidos da América e a Somália, ainda não ratificaram a Convenção sobre os Direitos da Criança.
Portugal rectificou a Convenção em 21 de Setembro de 1990.
A Convenção assenta em quatro pilares fundamentais que estão relacionados com todos os outros direitos das crianças:
1º A não discriminação, o que significa que todas as crianças têm o direito de desenvolver todo o seu potencial, todas as crianças, em todas as circunstâncias, em qualquer momento, em qualquer parte do mundo.
2º O interesse superior da criança deve ser uma consideração prioritária em todas as acções e decisões que lhe digam respeito.
3º A sobrevivência e o desenvolvimento sublinha a importância vital da garantia de acesso a serviços básicos e à igualdade de oportunidades para que as crianças possam desenvolver-se plenamente.4º A opinião da criança, que significa, que a voz das crianças deve ser ouvida e tida em conta em todos os assuntos que se relacionem com os seus direitos.Sejamos todos nós uma voz activa contra a violência sobre as crianças, pois elas são o futuro de uma sociedade que queremos cada vez melhor.

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